Apesar de muitos anos terem se passado, muitas parábolas Evangélicas que ouvimos na infância permanecem em nossa memória. Isto ocorre pelo fato das parábolas serem relatos de grande vivacidade e expressão. Foi para tanto que Cristo transformava algumas verdades religiosas em forma de parábolas — contos, para que estas verdades pudessem ser facilmente memorizadas e retidas na consciência. É suficiente mencionar o nome da parábola e logo vem à mente um vivo relato evangélico. Sem dúvida, em muitos casos, tudo termina com esta imagem evangélica, pois apesar de compreendermos bem o cristianismo, de longe não cumprimos todos seus mandamentos. O cristão deve, necessariamente, ter força de vontade para perceber o significado vital da verdade, e perceber a necessidade de obedece-la. Assim esta verdade tornar-se-á para nós uma nova e cálida luz.
Após um período relativamente longo, alguns meses antes da Via Crucis, Cristo revelou-nos suas novas parábolas. Estas parábolas formam, condicionalmente, o segundo grupo de parábolas. Nestas parábolas, Cristo revelou aos homens a misericórdia infinita de Deus, orientada para a salvação dos pecadores, e forneceu vários ensinamentos evidentes de como, seguindo o exemplo de Deus, devemos amar-nos uns aos outros. Iniciaremos a resenha desta segunda parte, discutindo o conteúdo de três parábolas: da Ovelha Perdida, do Filho Pródigo e do Publicano e o Fariseu, nas quais personifica-se a bem-aventurança de Deus às pessoas arrependidas. Deve-se examinar estas parábolas em relação à grande tragédia, fruto do pecado original, manifestada em forma de doenças, sofrimentos e da morte.
O pecado profanou e deturpou várias facetas da vida humana, desde os tempos mais remotos e imemoráveis. Os inúmeros sacrifícios realizados na época do Velho Testamento, e os rituais de lavagem do corpo forneciam ao homem a esperança do indulto de seus pecados. Esta esperança fundamentava-se na espera da chegada do Redentor à Terra, que deveria libertar os homens de seus pecados, e trazer de volta a bem-aventurança perdida na comunhão com Deus .
Parábola da Ovelha Pedida.
Esta parábola trata de maneira clara e evidente a tão esperada mudança para o melhor, para a Salvação, quando o Bom Pastor, o Filho de Deus, chega ao mundo para encontrar e salvar sua ovelha perdida — o homem pecador. A parábola sobre a ovelha perdida, assim como as duas parábolas seguintes, são contadas em resposta ao descontentamento dos livreiros judeus enraivecidos, que repreendiam Cristo por sua atitude compassiva aos pecadores inveterados.
"Que homem dentre vós, tendo cem ovelhas e perdendo uma delas, não deixa no deserto as noventa e nove e não vai após a perdida até que venha a achá-la? E achando-a, a põe sobre seus ombros, gostoso; e chegando à casa, convoca os amigos e vizinhos, dizendo-lhes: Alegrai-vos comigo, porque já achei a minha ovelha perdida. Digo-vos que assim haverá alegria no céu por um pecador que se arrepende, mais do que por noventa e nove justos que não necessitam de arrependimento" (Lc. 15:1-7).
Os orgulhosos e jactanciosos livreiros judeus esperavam que o Messias chegasse para formar um reino poderoso e glorioso, no qual eles teriam um papel relevante. Eles não compreendiam que o Messias é, antes de mais nada, um Pastor dos Céus, e não um dirigente terreno. Ele veio ao mundo com o intuito de salvar e trazer de volta ao Reino de Deus aqueles que admitiam ser pessoas irremediavelmente perdidas. Nesta parábola, a compaixão do pastor à ovelha perdida manifesta-se principalmente no fato do mesmo não tê-la castigado, e sim colocado sobre seus ombros e a trazido de volta. Isto simboliza a salvação da humanidade pecadora, quando Cristo crucificado tomou para si os nossos pecados, purificando-os. A partir disso, o poder expiatório do sofrimento da crucificação de Cristo possibilita o renascimento moral do homem, devolvendo-lhe a retidão perdida e o deleite da comunhão com Deus.
Parábola do Filho Pródigo.
Esta parábola completa a primeira, ao tratar do outro lado da salvação — do retorno voluntário do homem ao seu Pai Celestial. A primeira parábola trata do Salvador que busca o pecador com o intuito de ajudá-lo, já a segunda — trata do próprio esforço do indivíduo, indispensável para a comunhão com Deus.
"Um certo homem tinha dois filhos; E o mais moço deles disse ao pai: Pai, dá-me a parte da fazenda que me pertence. E ele repartiu por eles a fazenda. E, poucos dias depois, o filho mais novo, ajuntando tudo, partiu para uma terra longínqua e ali desperdiçou a sua fazenda, vivendo dissolutamente. E, havendo ele gastado tudo, houve naquela terra uma grande fome, e começou a padecer necessidades. E foi, e chegou-se a um dos cidadãos daquela terra, o qual o mandou para os seus campos a apascentar porcos. E desejava encher o seu estômago com as bolotas que os porcos comiam, e ninguém lhe dava nada. E, tornando em si, disse: Quantos jornaleiros de meu pai tem abundância de pão, e eu aqui pereço de fome! Levantar-me-ei, e irei Ter com meu pai, e dir-lhe-ei: Pai, pequei contra o céu e perante ti; Já não sou digno de ser chamado de teu filho; fazei-me como um dos teus jornaleiros. E, levantando-se, foi para seu pai; e quando ainda estava longe, viu-o seu pai, e se moveu de íntima compaixão, e, correndo, lançou-se-lhe ao pescoço e o beijou. E o filho lhe disse: Pai, pequei contra o céu e perante ti, e já não sou digno de ser chamado teu filho. Mas o pai disse aos seus servos: Trazei depressa o melhor vestido, e vesti-lho, e ponde-lhe um anel na mão e alparcas nos pés; E trazei o bezerro cevado, e matai-o; e comamos e alegremo-nos; Porque este meu filho estava morto e reviveu, tinha-se perdido e foi achado. E começaram a alegrar-se" (Lc 15:11-24).
Na parábola do filho pródigo, são apresentados traços característicos do percurso da vida de um pecador. A pessoa entretida com os prazeres mundanos, após uma série de erros e derrocadas, finalmente "cai em si," ou seja, começa a tomar consciência de sua futilidade, e da imundície de sua vida, e resolve, arrependida, retornar a Deus. Esta parábola é muito vital do ponto de vista psicológico. O filho pródigo somente soube avaliar a sorte de estar com seu pai, após o sofrimento que passara estando longe dele. É exatamente da mesma maneira que muitas pessoas só começam a dar o devido valor à comunhão com Deus quando sentem profundamente a mentira e a inutilidade de suas vidas. Partindo deste ponto de vista, esta parábola demonstra fielmente o lado positivo dos pesares e fracassos da vida. O filho pródigo possivelmente jamais teria caído em si, se a pobreza e a fome não tivessem lhe proporcionado a devida lucidez.
Esta parábola personifica o amor de Deus aos pecadores através do exemplo do pai sofrido, que saía diariamente pelos caminhos, na esperança de ver seu filho retornando. Ambas as parábolas apresentadas, da Ovelha Perdida e do Filho Pródigo falam-nos da importância e significado da salvação do homem para Deus. No final da parábola do filho pródigo (aqui omitido) fala-se do irmão mais velho, indignado com o perdão do pai ao irmão mais moço. Com a figura do irmão mais velho, Cristo subentendia os livreiros judeus invejosos. De um lado, eles desprezavam profundamente os pecadores - os publicanos, depravados, e outros, desdenhando-os; por outro lado, indignavam-se que Cristo tratava com eles, ajudando estes pecadores a trilhar o caminho do bem. Esta compaixão de Cristo aos pecadores levava-os à loucura.
Parábola do Publicano e do Fariseu.
Esta parábola complementa as duas parábolas anteriores concernentes à misericórdia de Deus, demonstrando que a humilde conscientização de seus pecados por parte do homem é mais importante para Deus do que os pretensos e orgulhosos benfeitores.
"Dois homens subiram ao templo para orar; um fariseu, e o outro publicano. O fariseu, estando de pé, orava consigo desta maneira: Ó Deus, graças te dou, porque não sou como os demais homens, roubadores, injustos e adúlteros; nem ainda como este publicano. Jejuo duas vezes na semana, e dou os dízimos de tudo quanto possuo. O publicano, porém, estando em pé, de longe, nem ainda queria levantar os olhos ao céu, mas batia no peito dizendo: ó Deus, tem misericórdia de mim, pecador! Digo-vos que este desceu justificado para sua casa, e não aquele; porque qualquer que a si mesmo se exalta será humilhado, e qualquer que a si mesmo se humilha será exaltado" (Lc. 18: 9-14).
Possivelmente, o fariseu descrito nesta parábola, não era má pessoa. Em todo caso, ele não fez mal a ninguém. Mas, conforme se pode observar à partir da parábola, ele também não realizou verdadeiras boas obras. Entretanto, ele cumpria rigorosamente os intrincados rituais religiosos, que até nem eram exigidos pelo Antigo Testamento. Realizando estes rituais, ele tinha um alto conceito acerca de si mesmo. Ele condenou a todos e só absolveu a si mesmo! (De acordo com as palavras de São João, as pessoas com esta inclinação são incapazes de avaliar a si mesmas de maneira crítica, de arrepender-se e de começar uma vida autenticamente virtuosa. Sua essência moral está morta. Por várias vezes Jesus Cristo criticou severamente a hipocrisia dos fariseus e dos livreiros judeus. Entretanto, nesta parábola Cristo limitou-se simplesmente a uma advertência, de que "o publicano desceu justificado para sua casa, e não aquele (o fariseu)," ou seja: o arrependimento sincero do publicano fora aceito por Deus.
As três parábolas apresentadas permitem-nos compreender que o ser humano é um ser ávido e pecador. Ele não tem nada de que se vangloriar perante Deus. Ele necessita tornar ao Pai Celestial com um sentimento de arrependimento e entregar sua vida sob a direção da bem-aventurança de Deus, da mesma maneira que a ovelha perdida entregou sua salvação ao bom pastor!
As parábolas a seguir ensinam-nos a seguir o exemplo de Deus em sua misericórdia, perdoando e amando o nosso próximo, independentemente destas pessoas serem conhecidas ou estranhas.